quinta-feira, 20 de março de 2008

no princípio era o S

Eu já fui um fraco, assim como você. Mas isso já faz tempo, muito tempo. Me veio à cabeça agora o episódio em que comecei a forjar meu estilo de vida. Ainda estava na escola. Uma professora que em outros idos fora deveras bonita - algo como uma violeta de ontem - tentava nos ensinar por que algumas palavras em Português têm dois Ss ou dois Rs. O exemplo que a dona Etimológica usou foi sucesso.

Alguns anos mais tarde percebi que essa palavra era semanticamente uma fraude. Mas isso era a época rebelde entre o primeiro beijo e o milésimo. Ela não era um lapso da língua, apenas a sua característica atrelada aos Ss imbuía no mundo dos homens algo indissolúvel. Afinal, essa história de precisar de duas letras juntas, repetidas, para formar um mesmo som não é questão de amizade, fraternidade, altruísmo ou compaixão. Isso se chama insegurança. E é por isso que hoje existem estas duas palavras, homônimas, porém não-sinônimas: sucesso e suceço.

Deixei o sucesso àqueles inseguros que se perguntam onde estão na vida, aos infelizes que esvaziam os bolsos em um divã em troca de frases montadas para acalentar sua existência pelos próximos 15 dias, aos tolos que crêem que prestar serviço à comunidade serve, no íntimo, como um mea culpa social. Aos jovens que buscam incessantemente preencher currículos para aumentar carteiras. E encolhê-las, sem saber por que motivo, ao perder o tempo único que têm na vida se lamuriando: "oh, céus, sou tão infeliz! Sou bem-sucedida, tenho carro (!), meus remédios me mantém inteirona (!!), por que minha vida é um saco?" Esse é o tipo de gente que se empanturra de doce e depois se mata na academia...

Eu não sou assim. Sei onde piso, enfrento problemas, assumo erros, aguento esperar. Ter um bom emprego, ser cercado de amigos, ler, estudar, refinar o gosto, tudo isso é uma evolução básica e linear a que a maioria têm acesso. Estar seguro de si, saber que vai dar tudo certo sempre, é um exercício constante.

De vez em quando eu tomo chá com dona Etimológica. Quando o fantasma tremulante da insegurança ameaça me assustar, basta um malte e um álbum de fotos para eu rir da cara dele. Cada pequeno sucesso da vida é o que compõe a felicidade. É por isso que digo: eu sou um suceço.

Rio de Janeiro, abril 2005

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Você é feliz? Fale comigo

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Tanto que inspirei um novo blogue, feito por gente talentosa e segura, galera Ulça - sem essa de ser do bem porque isso é muito mala. O melhor do pior e o pior do melhor do que rola nos virais 2.0, a evolução da piada de imeio!

Um comentário:

Anônimo disse...

OK, demorei a entrar, mas admito que seus blogs continuam inspiradores!