terça-feira, 29 de setembro de 2009

exame admissional

médico cara de joelho, nome eslavo: "já teve alguma doença?"
.... grilos cantam ao fundo, um rolo de feno passeia atrás de mim....
Mim- Como assim, que tipo de doença?
"Qualquer uma"
Então é claro que tive. Fiquei resfriado muitas vezes. Ah, e tive várias dores de ouvido na infância.
"Algo mais?"
Apendicite, dor de cabeça, febre, disenteria, pedra no rim e azia. Ah, tirei dois sisos também.

sexta-feira, 25 de setembro de 2009

[você está aí.]

terça-feira, 22 de setembro de 2009

ano da Índia

"Esta é uma tradição antiga e venerada pelo povo do meu país: começar uma história fazendo uma oração ao Poder Superior.
Imagino que Vossa Excelência também comece puxando o saco de alguma divindade. Mas de que divindade? As possibilidades são tantas...
Veja só: os muçulmanos têm um deus.
Os cristãos têm três.
E nós, os hindus, temos 36.000.000.
O que dá um total de 36.000.004 sacos divinos para Vossa Excelência e eu escolhermos.
(...)
Portanto, estou fechando os olhos, juntando as mãos num reverente namastê e pedindo aos deuses que lancem alguma luz sobre minha história sombria. Tenha um pouco de paciência, Mr, Jiabao. Isso pode demorar um bocado.
Quanto tempo Vossa Excelência acha que levaria para puxar 36.000.004 sacos?"


"O corpo de um homem rico é como um travesseiro de algodão de primeiríssima: branco, macio e sem marcas. O nosso é diferente. A coluna do meu pai era uma corda cheia de nós, daquele tipo que as mulheres usam, nas aldeias, para tirar água do poço; os ombros encurvados ao redor do pescoço, formando um relevo que parecia até uma coleira de cachorro; cortes, talhos e cicatrizes, como chicotadas em sua pele, percorriam seu peito e todo o seu torso, descendo até os quadris e a bunda. A história da vida de um pobre é escrita na sua pele, com uma caneta de ponta bem afiada."


"Isso é bem estranho: mate um homem e vai se sentir responsável pela vida dele - vai ficar até possessivo. Acabamos sabendo mais a seu respeito do que os seus próprios pais; estes conheceram o seu feto, mas nós conhecemos o seu cadáver. Somos os únicos a poder completar a história de sua vida; os únicos a saber por que o seu corpo foi levado ao fogo antes da hora, e por que os seus dedos dos pés se encolheram, lutando por mais uma hora na terra."


" - Pinky, isso era em Nova York. Não dá para dirigir na Índia; veja só esse trânsito... Ninguém obedece a qualquer regra, as pessoas atravessam feito loucas pelo meio da rua, olhe só... Veja isso...
Um trator vinha a toda pela estrada, soltando uma belíssima nuvem de fumaça de diesel pelo cano de descarga.
- E está na contramão! O motorista nem percebeu isso!
Eu também não tinha percebido. Bom, supostamente, devemos dirigir pela esquerda, mas, até então, nunca tinha visto ninguém tão aflito por causa dessa regra."


"Mr. Jiabao,

Quando Vossa Excelência chegar aqui, vão lhe dizer que os indianos inventaram tudo, da internet aos ovos cozidos e às naves espaciais, antes que os britânicos viessem roubar isso de nós.
Besteira. A coisa mais importante que se inventou neste país, nos seus dez mil anos de história, foi a Gaiola dos Galos.
Vá à velha Déli, atrás da mesquita de Jama Masjid, para ver como as aves são exibidas no mercado. São centenas de galinhas pálidas e galos de cores brilhantes, todos enfurnados em gaiolas de tela de arame, apertados ali dentro como vermes numa barriga, bicando uns aos outros, cagando uns nos outros, brigando só para arranjar um espaço para respirar. A gaiola tem um fedor impressionante, um fedor de carne emplumada e apavorada. Num balcão de madeira, por cima dessa gaiola, fica um jovem açougueiro sorridente, exibindo a carne e os órgãos de uma galinha recém-abatida, tudo ainda reluzente sob uma camada de sangue escuro. Os galos que estão na gaiola sentem o cheiro de sangue que vem do alto. Veem os órgãos dos irmãos ao seu redor. Sabem que serão os próximos. Mesmo assim, não se rebelam. Não tentam escapar dessa gaiola.
É exatamente a mesma coisa que se faz com os seres humanos neste país."



Do ótimo O Tigre Branco, de Aravind Adiga

terça-feira, 15 de setembro de 2009

do inferno

Ele não sabia como nem por que, mas sabia. Um vulcão destruiria a zona sul do rio de janeiro. toda a orla derreteria em questão de horas. acordou com esse pensamento, sem saber como nem por quê.

Não haveria escapatória, por causa sa geografia da cidade e a magnitude da erupção. Tampouco adiantaria avisar alguém - ninguém acreditaria. Então ele esperou o destino.

Entrou na sala de aula, era dia de simulado. Faltavam poucos minutos, mas o professor de geografia, que gostava dele, deixou que entrasse mesmo assim. Não encostou na prova. Ficava olhando o céu, esperando a nuvem de enxofre.

Não demorou 5 minutos. O céu ficou preto, enfumaçado. Em seguida, alaranjado. Você diz que sabia do que se tratava, uma erupção estava a caminho. Da janela da sala, enxerga uma bola de fogo derrubando um prédio como se fosse um castelo de cartas. Diz ao professor que não tinha cabeça para a prova, pede para sair e é liberado, sob um olhar de compaixão. Os outros estudantes, no entanto, deviam terminar o simulado, que era mais importante.

Pensa em ligar para ela para se despedir, mas não, se é para ligar pra uma pessoa, liga para a mãe. Ao sair, na calçada, de costas para ele, estava o Bruno, em sua cadeira de rodas. Ele o pergunta como estava a tragédia natural - agora como quem pergunta sobre uma chuva, não mais como se fosse o inferno de Dante de outrora. Ao que ele responde:
- Foi uma das explosões. O Centro-Oeste foi mais atingido pelos vulcões de lá. Parece que vai ter outra às 16h, essa sim vai ser forte.

Então havia uma chance de escapar! A premonição estava errada! Mas os fogos de artifício dentro da cabeça dele foram dissipados quando Bruno levantou da cadeira de rodas e começou a jogar bola. Suspeita. Chamou-o a um canto. As roupas estavam diferentes, mais folgadas, coloridas, estampas chamativas, mas sem nenhuma mensagem espertinha ou bem sacada, apenas a grife, direta, reta e enorme. Suspeita 2.
"Cara, será que a erupção já está no YouTube?"
- O que é YouTube?

Fodeu.

Então era isso. Ele era o efeito borboleta. Será que, além de poder escapar, ele poderia salvar, mudar alguma coisa, consertar as burradas acumuladas? O ano era 2000, as explosões nessa época foram realmente menos intensas, acabara de lembrar. Então, o que fazer para evitar estar ali em 2009?

As coisas podiam mudar, ser diferentes, o velho papo de destino foi para o espaço. Mas, ao entrar na garagem para sair logo dali, o calendário regressa mais uns 8 anos. E lá estava o menino Jason, esperando o ajuste de contas da infância. Na primeira investida do menino mau contra ele, não tinha jeito, era preciso eliminá-lo. Talvez de um jeito mais sutil e nobre, mas crianças não levam isso em conta. Após algumas perseguições numa sinistra garagem de prédio, ele usou uma lasca de tijolo para tentar cortar a cabeça do Jason. Porém, a iminente aparição de um grupo de meninas impediu a conclusão do rito macabro, e ele o abandonou ali, cabeça pendente, meio torta, uma enxurrada de sangue no chão escuro, cheio de pó e óleo, daquela garagem.

Subiu alguns lances de escada, viu de soslaio que o pequeno diabo permanecia de pé, andando moribundo. Temeu que ele não morresse e sofreria consequências pesadas. Esperou um tempo no topo do prédio. Desceu, viu alguns caras do trabalho em trajes escolares e esportivos. Todos tinham 10 anos, usavam tênis puma que não tinha cara de ser vintage, caro ou descolado - era o tênis do dia-a-dia. Eles o reconhecem, e você chama um antigo conhecido do primário:
- estava lá em cima esperando uns 5 minutos. você sabe que tentei cortar fora a cabeça do Jason, né? Ele morreu?
- Não. Aliás, você esperou 5 minutos, mas demorou 5 anos para trás. Estamos nos anos 80, e o Jason agora é aquela criança branca, cara de anjinho, brincando naquela turma.

Ele seria infernizado na escola. Ele sobreviveria à erupção de 2000. E, antes do derretimento total da cidade, ele faria uma série de coisas, muitas das qual se arrependeria, sim, porque quem não se arrepende de nada não tem alma.

quinta-feira, 10 de setembro de 2009

resenhas de uma frase só

'Sequestro do Metrô 123' mostra, nesses tempos meio keynesianos, a pouca diferença que pode haver entre especuladores da Bolsa e terroristas.

'Brüno' é o Borat mais escatológico, tão polêmico quanto e menos inteligente, porque consegue ser grotesco até para fãs de Hermes & Renato, mas tem o vácuo de críticas ácidas que o repórter cazaque não deixaria passar.

quarta-feira, 9 de setembro de 2009

napalm

De volta ao lugar onde se cantava o hino e hasteava a bandeira. sem atitude, sem iniciativa, contando com a proteção do velho e experiente coronel que alvejava inimigos a 300 metros de distância.

Mal conseguia discernir inimigos de aliados naqueles uniformes camuflados. quando localizava um, pestanejava em atirar, queria que ele saísse correndo pata não ter que matá-lo. mas isso é guerra.

uma granada é atirada na pedra em que ele e o coronel estão. o velho desaparece na penumbra, e ele se arrasta, a perna pesando como chumbo, e então se dá conta de que está ferido. "não tiraram o pino, a granada está desativada", gritam."bobagem, essa é contagem regressiva. Em 38s..." BAM

Sem olhar pra trás, segue mancando no fogo cruzado até ser amparado por uma jovem mulata, também fugindo. Ambos se escondem em um abrigo para orfãos negros, que está pessimamente localizado bem no meio da batalha. por alguns minutos, parecem a salvo. A moça que o ajudou decide voltar, mas ele, mesmo com medo de ficar sozinho ali, permanece.

uma grande luz branca brilha atrás do abrigo. parece um tanque ou um outro grande veículo blindado. No meio de dezenas de crianças negras, só resta a um adulto branco se fingir de morto. é oq se faz. Aquela policial durona e morena surge com os coturnos em frente à cara dele. Cutuca com o fuzil, pega pelo queixo, ele sabe q não consegue prender a respiração. Em segundos, seria executado - ou levado prisioneiro. mas não. Ela o largou e seguiu caminho.

finalmente, toma uma atitude e decide sair. encontra o Gustavo no local onde a bomba explodira. A noite se aproxima e, com ela, as horas mais mortais. "por isso eu durmo uma hora a menos no front", ele diz. fita-o como se fosse um retardado e o deixa ali.

"Ver Apocalypse Now do lado de dentro não é tão legal. Perdi a cena dos helicópteros porque estava com a cara enfiada na grama", pensa. Para salvar o pouco de honra que lhe restava, ele decide abandonar a batalha, saindo por onde entrou: o portão da escola

quinta-feira, 3 de setembro de 2009

au au au

Husky falante e apaixonado. Saudade deles