quinta-feira, 2 de junho de 2011

ó, vida


Trechos do visceral e melancólico Misto-Quente, de Charles Bukowski:

"Eu gostava dos sons das teclas, principalmente os das mais agudas, que quase não tinham som nenhum - pareciam cubos de gelo se chocando uns contra os outros."

"Lá fora, através da janela dos fundos, eu podia ver as rosas do meu pai crescendo. Elas eram vermelhas e brancas e amarelas, grandes e viçosas. O sol já ia baixo, mas ainda não havia se posto, e seus últimos raios penetravam ainda pela janela. Tive a impressão de que até mesmo o sol pertencia a meu pai, que eu não tinha nenhum direito sobre ele porque iluminava a casa do meu pai. Eu era como suas rosas, algo que pertencia a ele e não a mim..."

"Por volta dos 25 anos, a maioria das pessoas estava liquidada. Uma maldita nação inteira de desgraçados dirigindo carros, comendo, tendo bebês, fazendo todas as coisas da pior maneira possível, como votar em candidatos à presidência que os fizessem lembrar de si mesmos."

"À medida que meus olhos foram se ajustando, me dei conta do homem parado alguns metros à minha frente. Metade de sua orelha esquerda tinha sido arrancada em algum lugar do passado. Ele era alto, um homem muito magro com as pupilas cinzentas do tamanho de uma cabeça de agulha, centradas em uns olhos inexpressivos. Um homem muito alto e magro, ainda que, logo acima do cinto, encobrindo a fivela - subitamente -, caísse-lhe uma barriga triste e estranha e horrenda. Toda sua gordura se concentrara ali, deixando o resto de seu corpo descarnado."

"Que tempos penosos foram aqueles anos - ter o desejo e a necessidade de viver, mas não a habilidade."

" - Qual desses cursos fodidos é o mais fácil de se fazer? - perguntei-lhe.
- Jornalismo. Esses sujeitos especializados em jornalismo não fazem nada.
- Beleza, serei jornalista.
Dei uma olhada no folheto da escola.
- O que é esse Dia da Orientação de que eles falam aqui?
- Oh, esquece isso, é pura merda.
- Obrigado, parceiro. Em vez de perdermos nosso tempo com isso, vamos até o bar do outro lado do campus tomar duas geladas.
- Mas que beleza!
- É."

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